6 de novembro de 2013

Enxergar com o cérebro

Abro uma janela do computador. Ali tem cerca de 30, talvez 50 itens, chamados de arquivos. Procuro um, só um. Levo menos de 2 segundos até que, de repente, meus olhos acham o que eu procurava: a caixa de busca. Impressionante, eles se dirigiram automaticamente para lá.

Isso me fez lembrar algo que há muito estava perdido em minha memória e que também envolve olhos.

Meu pai sempre fez questão de ir e voltar do trabalho a pé. Durante um bom tempo usava a bicicleta para ir ao consultório. Mas a maioria das vezes era a pé mesmo. Aí, me lembrei agora, de muitas vezes em que estava na rua, brincando, e o via chegando, lá na esquina e corria para encontrá-lo.

Pois bem. Não eram raras as vezes que ele estava de olhos fechados, andando com a mão “raspando” nos muros e grades das casas pelas quais passava. Para alguém que não o conhecesse poderia parecer estranho, mas eu sabia muito bem a razão daquilo.

Era a mesma razão pela qual se podia vê-lo trocar inúmeras vezes a caneta de mão ao escrever, ou mesmo para escovar os dentes: “é preciso exercitar o cérebro, pois ele é como qualquer músculo do corpo. Se não exercitar ele atrofia”.

Quantas vezes escutei isso e cresci com isso em meu estilo de vida.

Mas agora vejo que o mundo de hoje, esse mundo 2.0, 3.0, ou sei lá quantos pontos zeros, nos dá tudo de mão beijada. “Tá difícil de achar? Usa a busca!”

A começar pelo ‘está’ que já virou ‘tá’, assim como o ‘você’ virou ‘vc’ e mts outras tbm, até nossa preguiça mental, que não é mais capaz de perder 30 segundos, um minuto para procurar alguma coisa. Mas já perde a paciência e, em dois ou três segundos já apela para um ‘atalho’.

Nicholas Carr, em seu livro O que a Internet está fazendo com nossos cérebros – A Geração Superficial”, conta que “costumava mergulhar em um livro ou em um artigo imenso (...). Agora, isso raramente acontece. Minha concentração começa a se extraviar depois de uma ou duas páginas. Fico inquieto, perco o fio, começo a procurar alguma coisa mais para fazer. Sinto como se estivesse sempre arrastando o meu cérebro volúvel de volta ao texto. A leitura profunda que costumava acontecer naturalmente tornou-se uma batalha” (Pág. 17).

A internet trouxe, e traz, a cada dia, inúmeros e grandes benefícios e vantagens.

Mas, de agora em diante vou lembrar um pouquinho de meu pai caminhando de olhos fechados e vou tratar de exercitar mais meu cérebro.

Hugo Nogueira Luz

1 comentários:

Unknown 18:58  

Hugo, também vivi essa experiência com o Hugo, pai.. Lembro-me delas, apesar de esqueçer de exercitar. Incrível.
Parabéns pelo texto, pela sensibilidade na arte de escrever.
Você ainda é jovem para ter essa percepção de quanto a atitude ON, pode nos limitar apesar de abrir as possibilidades de conhecimento cientifico. Que bom que a tem.
Estou em busca do OFF, de tatear com as mãos o conhecimento externo.

  ©Template by Dicas Blogger.